segunda-feira, janeiro 27, 2014

De Pé Sobre a Terra

 Disponível a partir de hoje, precisamente.
Textos referentes a 4 encontros, organizados pela Universidade Nova de lisboa e pela Universidade Popular do Porto. 1297 páginas on line, podendo descarregar o livro aqui: http://run.unl.pt/handle/10362/11192

João Castela Cravo, 2013, A habitação Operária na Amadora, o caso do Eixo venda Nova-Porcalhota, in De pé sobre a Terra, Estudos sobre a Industria, o trabalho e o Movimento Operário em Portugal. Lisboa: UNL/UPP. pp. 115-124

domingo, maio 08, 2011

As Festas da Árvore, a Amadora e a República - Ritualizar para Integrar


Bemdita sejas tu, ó árvore, entre quantas

Jóias de estimação a natureza encerra!

Fonte de sumo bem, imperatriz das plantas,

Bemdita sejas tu, obra prima da terra!

Delfim GUIMARÃES[1]

“(…) não deixeis de concorrer para que as suas festas, revistam todo o esplendor e nunca lhes recuseis a propaganda, o elogio, a divulgação, que eu decerto não soube fazer, á altura dos meus desejos

J. Penha COUTINHO[2]

0.

Num texto publicado em 1870, no Jornal A República e intitulado “Liberdade de Cultos”[3], Oliveira Martins defende a ideia de que o Estado, sendo o órgão de Direito da Sociedade (sociedade que para ele seria um grande organismo, vivo e autónomo) deve ser indiferente à religião. Para ele, o crente não é o cidadão. O cidadão existe para o Mundo, para outros homens, enquanto o crente existe somente para Deus, o seu Deus. Mas Oliveira Martins não escreve este texto sob um ponto de vista crítico ou contrário à religião. Pelo contrário, assume-se como um “amigo” de uma religião “(…) por tantos lados simpática (…)”[4] (o cristianismo), propondo aos crentes evitar a morte dessa fé através de uma aliança com uma doutrina nova, a da Liberdade. Porém, o Historiador e futuro ministro afirma também que o progresso na Europa nos últimos quatro séculos se deve “(…) sobretudo à gradual secularização dos Estados, à irreligiosidade crescente das civilizações modernas, cada vez mais científicas e liberais, à derrota do velho espírito teológico, que uma concepção racional e toda humana e naturista do mundo vai por toda a parte substituindo[5]. Não será despropositado incluir Oliveira Martins dentro de um paradigma do universo intelectual do Portugal da transição de oitocentos para novecentos e da monarquia para a república. Socialista e republicano, ele irá ser ministro num governo monárquico, aliás situação bem integrada[6] na matriz deste tempo, a que em outro lugar chamei o tempo de Janus[7].

Este tempo português é eivado de um romantismo serôdio, ligado sobretudo a um historicismo que se queria regenerador da Pátria[8]. Apresentava-se como profundamente racionalista[9], assentando num cosmos em que a Natureza se afirma como naturante do ser, estruturalmente ontofânico, portanto. Mas, por outro lado, ele é marcado por um passado hierofânico, em que o ser se confundia com o sagrado. Este passado vai implicar um quase paradoxo, em que o homem racional continuará a ser um homem religioso, pois o homo profanus é descendente do homo religiosus, não conseguindo anular de uma forma total a sua própria história[10]. Ontologicamente, o homem deste tempo, o tempo de Janus, apresenta-se como a-religioso, numa estrutura religiosa de pensamento.

1. Civilização e Regeneração – a Festa da Árvore como Ritual Integrador da Instrução Republicana

Já atrás marcámos o tempo de que estamos a falar. Repetimo-lo – este é o tempo de transição de oitocentos para novecentos e o da transição da Monarquia para a República. Neste tempo o conceito de civilização é fundamental para a racionalidade vigente. Partia-se de uma ideia de civilização que só agora chegava a um verdadeiro existir. Numa perspectiva de civilização, no sentido de acumular civilização, o culto de Deus seria substituído, precisamente, pelo culto às coisas civilizacionais. E se não às coisas, então às causas.

Ora, uma destas causas civilizacionais, em Portugal, vai ser a já referida regeneração da Pátria. A regeneração radica-se no Iluminismo, baseada na ideia rousseauniana do Homem Novo, e apresentava-se em dois patamares – a regeneração miraculosa e a regeneração laboriosa. Em Portugal, este conceito da regeneração laboriosa perpassa todo o século XIX, radicando-se logicamente e sobretudo na Regeneração de Saldanha de 1851. Assumia nesta hora o renascimento político e económico do país, um mudar de rumo comandado pela burguesia[11]. Ancorada no “fontismo”, esta regeneração prefigura, em especial, um progresso material do país, à “europeia”. Contudo, já nas últimas décadas de oitocentos, em especial a partir de 1870, o conceito de regeneração material é cada vez mais cruzado com o de regeneração moral. Com Saldanha a regeneração foi política, com Fontes Pereira de Melo ela teria sido sobretudo económica. Agora, os projectos republicanos (incluindo o socialista) vão pegar, em especial, numa regeneração civilizacional[12]. Numa nota marginal, podemos dizer que a Geração de 70, como forma de regeneração do pensamento português, assenta aqui como uma luva.

Se com facilidade o republicanismo apreende este conceito de regeneração, também com facilidade estabelece uma ligação entre esse conceito e a instrução. Já em 1912, José de Castro, o qual ainda tornaremos a referir, escreve: “A Regeneração do povo tem que ser material e moral: uma e outra realizam-se com a educação e a instrução, postas ao serviço dum elevado e nobre sentimento – a amor da Pátria (…)”[13].

Agora, para além desta ideia de Regeneração Civilizacional, obviamente marcante numa mentalidade afinal organicista e finalística, era necessária uma atitude programática acompanhada de ferramentas que lhe dessem corpo. Essa atitude foi a promoção da instrução e as ferramentas serão a Festa e a Árvore. A Festa como ritual integrador, bem à maneira da Maçonaria, sua proponente, bem como do republicanismo[14] e a Árvore, um símbolo ancestral, tão do agrado do naturalismo racionalista, quiçá descendente das ideias panteístas, por exemplo do Barão de Holbach[15], e muito bem aceite pelas componentes republicanas da maçonaria e da Carbonária que, após 1890 lideravam a luta contra a monarquia em Portugal.

Assim, surgem no país as Festas da Árvore, com este cunho cívico ligado à instrução, mas também de combate e propaganda republicana. As primeiras vão ser em 1907, no Seixal (Maio) e em Lisboa (Dezembro), impulsionadas por, entre outros, Borges Grainha, maçon e membro da Liga Nacional de Instrução. Aliás, de 1908 a 1912, é esta Liga, na altura presidida por Bernardino Machado, que lidera decididamente este processo, tendo sido realizadas Festas em dezenas de localidades portuguesas.

A partir de 1910, a necessidade era fundamentalmente integrar, mas o entusiasmo foi menor que antes da república. A Liga de Instrução tem agora interesses mais especificamente educacionais. Assim, será a vez do Jornal “O Século Agrícola” tomar conta do processo, de 1912 a 1917, com o apoio da Associação Protectora da Árvore, lançada pelo Senador[16] José de Castro, através da sua “Circular ao Povo de Portugal”[17] e constituída, formalmente, em 1914. Até à entrada de Portugal na I Guerra Mundial, são muitas as iniciativas realizadas, com forte impacto nacional, devido à cobertura da imprensa.

A partir de 1917 estas iniciativas praticamente desaparecem, por um lado devido às novas condições económicas e políticas[18], mas também pela forte reacção católica[19], sendo que a partir de 1926 elas desaparecem definitivamente.

2. A Amadora republicana e as Festas da Árvore

Podemos fixar a formação de uma nova estrutura urbana na Amadora[20], entre 1890 e 1910. Por coincidência (ou não) estas duas décadas são também aquelas em que a monarquia portuguesa, já ferida de morte, acentuou a sua decadência e acabou por falecer.

O 5 de Outubro surge como uma situação tardia devido ao regicídio de 1908. Mas o que é facto é que havia desde já há algum tempo, uma republicanização do país com uma ideia de República que era sinónimo de desenvolvimento e inovação. Esta republicanização fazia-se sentir, obviamente, na recente Amadora. Os novos habitantes, portadores de uma cultura urbana e burguesa intelectual, eram em grande parte republicanos, em especial aqueles mais intervencionistas – Delfim Guimarães, poeta, livreiro, maçon, foi considerado por Roque Gameiro um dos principais republicanos da sua época, constituindo-se como um bom exemplo. Mas outros haveria, o próprio Roque Gameiro, António Rodrigues Correia, Raul de Campos Palermo, Inocêncio Madeira, João de Araújo Morais, Theodoro das Neves, José dos Santos Mattos, Manuel da Silva Lírio, e tantos outros.

Em 1909, de 29 de Março a 4 de Abril, realizou-se a primeira Festa da Árvore na Amadora, tendo à sua cabeça, Joaquim Theodoro das Neves, do qual pouco se sabe, embora não custe aceitar uma filiação maçónica deste alto funcionário da Imprensa Nacional[21]. Em 1910, a 29 de Maio, realizou-se a segunda, já com a organização da Liga de Melhoramentos, criada na sequência da primeira Festa. A Alvorada pela Banda da Sociedade Filarmónica Recreios Artísticos e foguetório marcou o início da Festa, às 6 da manhã. Distribuição de vestuário às crianças pobres das escolas, sessão solene no Parque Castro Guimarães, lanche para as crianças presentes e um cortejo cívico marcaram a Festa, para além da plantação de árvores[22], claro está!!! Na sessão solene, Azevedo Neves, presidente da Liga de Melhoramentos tinha discursado sobre a importância da árvore e da sua Festa, tendo o seu discurso sido publicado, mais tarde, pela Liga.

Talvez devido à morte de Theodoro das Neves em 1911, como já referido, o principal impulsionador das primeiras festas, até 1913 não se realizaram este tipo de eventos no lugar. Mas em contrapartida, a de 1913 ofuscou em lustro as duas anteriores. Na realidade, em 1913 houve duas Festas da Árvore na Amadora. A primeira e de menor brilho, realizada a 10 de Março, foi organizada pelo “O Século Agrícola”, tendo um carácter nacional e, por assim dizer já algo domado.

Mas a grande Festa vai realizar-se a 13 de Abril, designada como Festa da Árvore e das Escolas e terá a organização da Liga de Melhoramentos da Amadora. Às 9 da manhã começaram os festejos com a entrega de um bodo aos pobres e a distribuição de vestuário a 90 crianças necessitadas. Às 13 horas, com a Amadora cheia de forasteiros[23], iniciou-se o desfile de carros alegóricos, que partiu do Parque Castro Guimarães ia até à Porcalhota e voltava. Pelas 14 horas chegou o Presidente da República, Manuel de Arriaga. Mal chegou foi imediatamente “raptado” por Raul de Campos Palermo e efectuou uma visita ao Quartel dos Bombeiros, a qual não estava no programa mas que representa um dos momentos de rivalidade entre os “notáveis” da Amadora.

Seguidamente Arriaga vai para o edifício em frente aos Bombeiros, conhecido como “Palácio” onde inaugura as novas instalações das Escolas Oficiais e assiste ao resto do desfile. É tempo de discursos e sessão solene, deslocando-se depois o Presidente à actual Freguesia da Mina e inaugurando aí o Bairro-Parque da Amadora, simbolizado pelas instalações da Mina de Água[24] tendo sido produzidos mais uns discursos. A festa acabou no “Rink” de patinagem dos Recreios Desportivos com uma merenda para 400 crianças, mais alguns discursos e uma largada de 400 pombos!

Só uma nota á margem – no desfile de carros alegóricos para além dos carros propriamente ditos, da GNR a cavalo, dos Bombeiros, da comissão Administrativa de Oeiras, de 5 bandas de música, participaram ainda 262 crianças de escolas da Amadora e de Paço de Arcos!!!

As Festas da Árvore na Amadora são um dos exemplos em que as suas características integradoras são perfeitamente visíveis. Integradoras, não só dos ideais republicanos, mas também de uma nova cultura urbana que se queria estabelecer na região. As duas primeiras Festas são sobretudo de combate cívico, aliás tal como outras iniciativas que se realizaram antes do 5 de Outubro e se continuarão a realizar depois – festivais desportivos, festas, espectáculos de teatro, festivais aéreos, festas escolares – toda uma panóplia de eventos que permitiram a consciência de uma nova vizinhança que, para além do mais, eram também republicana.

A Festa de 1913 (a organizada pela perla Liga de Melhoramentos da Amadora), essa já tem um carácter diferente, sendo claramente cintada por dois propósitos. Por um lado questões pedagógicas, essas já vindas de trás, pois uma das preocupações vincadamente republicanas na Amadora, era a instrução[25], por outro havia o paradigma da inovação urbana e da urbanidade, bem como a disputa do poder social e económico, feita por alguns dos “notáveis”, em especial António Corrêa e José dos Santos Mattos, da Fábrica de Espartilhos a Vapor e António Cardoso Lopes da Empresa do Bairro-Parque da Amadora. Assim se juntava republicanismo, bairrismo e luta pelo poder.

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[1] GUIMARÃES, 1910, p.15

[2] COUTINHO, s.d., p.13

[3] In MARTINS, 1948, pp.1-24. Originalmente publicado em A República, nºs 2, 4 e 5 (1870)

[4] Opus cit, p.24

[5] Idem, p.16

[6] Azevedo Neves, por exemplo, que escreveu para a Festa da Árvore da Amadora (cf. NEVES, 1909) e pertenceu à Comissão Executiva da Liga de Melhoramentos da Amadora (uma instituição de matriz republicana, era monárquico mas foi ministro num governo republicano, liderado por Sidónio Pais.

[7]“ (…) este é um tempo complexo [1890-1930], no qual o mito de Janus se integra perfeitamente. Cada um dos vértices é sempre ancorado pelo seu outro lado.”, in CRAVO, 1998, P.71

[8] Havia ainda uma outra proposta de regeneração, colada a uma ideia de civilização internacionalista e cosmopolita, assentando num espaço-tempo diferente, mas acabando por ter a mesma significação social.

[9] Referenciando-nos, claro está, à maioria dos pensadores portugueses da época, ou pelo menos aqueles que deram a conhecer o seu pensamento.

[10] Cf. ELIADE, s.d., p.215

[11] Cf. RIBEIRO, 1993, P.121.

[12] Para além deste termo, outro que aparece é o de “Redenção”. Por exemplo, no dia 6 de Outubro de 1910, o Diário “A Pátria”, da cidade do Porto, dirigido por Duarte Leite, intitulava o seu principal artigo com a seguinte pergunta: “Portugal a caminho da Redenção”? Redenção, um termo quase sagrado que impunha uma missão sagrada – era necessário que se redimisse o país, que se fizesse a sua regeneração.

[13] In CASTRO, 1912.

[14] Recordem-se as Festas do Centenário de Camões.

[15] Cf. FERNÁNDEZ, 1998

[16] Senador à época.Eem 1915 foi presidente do Conselho de Ministros. Foi também membro da Maçonaria, tendo sido Grão Mestre Adjunto.

[17] Cf. CASTRO, 1912.

[18] Há uma tentativa de as ressuscitar em 1923.

[19] Houve mesmo situações de vandalização de árvores plantadas durante Festas, em vários pontos do país, mormente em Lisboa.

[20] Uma estrutura urbana resultante de um processo de rurbanização (mais tarde, também de suburbanização) a partir da abertura da actual Linha de Caminho-de-ferro de Sintra, em 1887.

[21] Em 1914, num poema em sua honra, Delfim Guimarães trata Theodoro das Neves como o “Pae Neves”.

[22] Em especial no Parque Castro Guimarães, cujos terrenos tinham sido oferecidos à Amadora pelo conde com aquele título e que mais tarde acabará por ser absorvido pelo campo de aviação do Grupo de Esquadrilhas de Aviação “República”.

[23] Só do Rossio partiram 5 comboios especiais.

[24] Ainda hoje existentes.


in João Castela Cravo
As Festas da Árvore, a Amadora e a República - Ritualizar para Integrar
Vértice, nº 154, II Série, Setembro/Outubro 2010, pp. 103-108

quinta-feira, junho 18, 2009

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In Catálogo da Exposição Colectiva dos Ateliers do Centro Cultural Roque Gameiro, 2008
Uma das coisas que permite distinguir o Homem de outros animais é a memória. Não a memória física, que essa também outros dos nossos companheiros na Terra a possuem, mas a memória colectiva material. Por outras palavras, a História, por outras palavras ainda, a Cultura!

Alfredo Roque Gameiro fez inscrever na verga da porta principal da sua casa, na Amadora, a frase – “Honra teus avós”. O Centro Cultural que do insigne Mestre aguarelista e gravador extraiu o nome e que nessa casa (aliás, nesta casa) nasceu, ao longo dos seus 34 anos de existência tem feito por dar uma vivência própria a esta frase. Na Casa Roque Gameiro, ou nas sedes que o centro sucessivamente tem ocupado, sempre esta associação se tem comportado como divulgadora, mas sobretudo como produtora de cultura, logo produtora de História. No panorama da História da Cultura da Amadora, é hoje incontornável o papel deste Centro, desde o tempo da Câmara de Oeiras, em que os seus membros se esforçavam para demonstrar que a “Amadora não era só cimento”, que tinha uma História própria e que reflectir sobre essa sua História era uma forma de dar identidade à população que o êxodo rural dos anos 50 e 60 para aqui tinha “atirado”.

Hoje, o papel do Centro Cultural Roque Gameiro é, necessariamente, outro. Mas, porventura, o seu espírito colectivo mantém-se, mesmo que as actividades sejam diferentes. Cada vez mais as suas valências estão ligadas à formação e à produção oficinal, mas só pode haver boa formação e boa produção com uma continuada reflexão acerca do seu próprio devir que, na realidade deve sempre ser um devir em paralelo da entidade, dos seus vizinhos e do seu território, que é o território da Amadora.

É por isso que esta exposição, mais do que uma mostra dos cursos que se fazem no interior do Centro, pretende ser uma outra coisa. Algo que ao longo da sua História nunca abandonou e que lhe permite continuar a “honrar os seus avós”. No fundo, com esta exposição queremos renovar o nosso compromisso com este concelho, que afinal também ajudámos a nascer e a fazer crescer – Centro Cultural Roque Gameiro – O Centro Cultural da Amadora!

João Castela Cravo
Venteira, 17 de Junho de 2008

terça-feira, junho 16, 2009

Vitrais

Desde muito cedo que os construtores perceberam a importância da luz na Arquitectura. Aliás, de tal forma se relevou esse facto, que hoje em dia a luz é considerada uma das matérias-primas mais importantes desta arte, senão a mais importante. E a luz é cor, é movimento, é ambiente.

Bem o entenderam os mestres construtores das catedrais góticas, que para além das enormes entradas de luz, grandes vãos vazados ou rosáceas finamente rendilhadas, utilizaram ainda os vitrais – verdadeiras pinturas de pedaços de vidraça colorida, bastas vezes historiados ou simplesmente de expressivo valor decorativo. A qualidade e a funcionalidade dessas obras, remete o vitral para um lugar cimeiro do reconhecimento público ao nível da História da Arte. Obra de operários anónimos, torna-se num elemento facilmente percepcionável pelos usuários da arquitectura, modelando e dinamizando formas e cores.

Curiosamente, a partir do século XVII, o vitral perde terreno na História da Arte Ocidental, provavelmente por questões ligadas à Reforma da Igreja. Contudo, os eclectismos oitocentistas recuperam, em parte, este saber-fazer, mas a sua especificidade técnica torna-o agora demasiado dispendioso para uma utilização usual.

Entretanto chega a vez daquele a que podemos chamar vitral moderno, mais propriamente pintura em vidro. A utilização de tintas gordas, transparentes e/ou opacas, juntamente com o contorno através do cerne, permitem uma expressividade idêntica ao do antigo vitral de vidraças cortadas. Embora tecnicamente diferentes, o valor da luz coada é semelhante, permitindo ambiências de qualidade e mais interessantes sob o ponto de vista económico. Mas esta é uma técnica que tem vindo a perder em termos estéticos, aparecendo quase sempre sob uma forma apenas decorativa e pouco criativa.

Nesta perspectiva, há que mudar, que inovar. E para inovar é preciso traquejo, contacto com a criação.

Esta exposição corre nesse sentido. Os formandos foram levados a percepcionar obras de outros autores, transpondo para a pintura em vidro outras técnicas, ou melhor, resultados de outras técnicas. As características expressivas deste tipo de vitral, acabam por conseguir uma re-criação, uma apropriação estética e funcional dessas obras, que, longe de constituir uma simples cópia, acabam por fazer emergir outros valores, importantes, eles mesmos, num processo de formação.

Releva-se ainda o tema escolhido – o corpo humano. É um tema, pela sua plasticidade intrínseca, que casa bem com esta técnica. As sinuosidades tácteis, impressivas do corpo, permitem o plasmar voluptuoso de formas no espaço plano, formas que vão ser valorizadas pela iridescência da passagem da luz pelas tintas. Então, os corpos migram, a ideia é corpórea, o resultado é luminoso.


João Castela Cravo


Venteira, 9 de Abril de 2007

in catálogo "Nus", Exposição de Vitrais, colectiva dos alunos dos cursos realizados no Centro Cultural Roque Gameiro, Casa Roque Gameiro, 5 de maio a 9 de Junho de 2007

sábado, maio 09, 2009

Lembrar Vasco Granja

Foi em 1978 e eu andava no 6º ano do Ensino Complementar (o actual 10º ano do Ensino Secundário).
A minha turma do Liceu da Amadora (o 6º18), decidiu fazer um Dia Cultural. Tivemos algumas dificuldades em convencer o Conselho Directivo, mas creio que foi a primeira iniciativa naquela escola, proposta e realizada apenas por alunos.
Ideias havia muitas. Música, exposições, conferências. O Ângelo, que era da Damaia, teve a ideia de se fazer uma exposição sobre cinema de animação. Ele sabia que o Vasco Granja era seu vizinho e tinha confiança que ele nos poderia ajudar.
E assim lá fomos, quatro de nós, bater-lhe à porta.
E ele abriu-a, disse para entrarmos, ajudou-nos com ideias, contactos e vários "digam que vão da minha parte" e deixou-nos com um misto de agradecimento e admiração, não só pela ajuda que nos tinha prestado, mas sobretudo, pela forma simpática e serena com que nos tratou, áquele grupo de adolescentes, sonhadores e armados em rebeldes...

sábado, dezembro 08, 2007

Memória da Estação






Será redundância referir o facto do historiador lidar com a Memória. Quase sempre com a memória dos outros, mas sempre num processo dialéctico em que se apropria dessas memórias e em que as torna suas.
No caso da História Local, muitas vezes a memória dos outros se confunde com a memória do próprio historiador. Aí quase que chegamos a uma situação de Ego-história, um ramo ainda novo e pouco explorado da História, em que se parte do próprio historiador, da sua memória pessoal, para uma análise do seu espaço-tempo.
Tudo isto para referir a minha relação vivencial, portanto afectiva, com a Amadora, havendo no caso da Estação da CP, duas situações que me acodem imediatamente à memória.
Uma primeira, mais antiga e esfumada, transporta-me para os meus tempos da infância, para os anos 60. Oriundo de uma família da Beira Baixa, os meus pais para aqui vieram, ainda eu não tinha um ano. E das recordações mais antigas que tenho, uma das mais agradáveis era quando se recebia cestos carregados de vitualhas, despachados de castelo Branco para a Amadora, via CP. Lembro-me de os ir buscar à Estação, antevendo um qualquer mimo da minha avó, por baixo da serapilheira cosida ao rebordo do cesto de verga. No largo da Estação, junto ao barracão das mercadorias, vários triciclos motorizados aguardavam serem fretados para levar volumes a casa de alguém.
Outra recordação, esta um pouco mais recente vem do tempo da minha adolescência, na altura em que estudava no ainda Liceu Nacional da Amadora. Sei que esta memória a partilho com muitos, que na altura eram jovens, e até muitos mais novos que eu. Curiosamente prende-se com um relógio. Quando entre amigos combinávamos um encontro e se perguntava onde, quase invariavelmente a resposta era – “Debaixo do relógio da Estação!”.
in Amadora*100 anos - Exposição

quinta-feira, setembro 22, 2005

Garcia de Resende, o Humanista e a sua casa em Évora

Garcia de Resende nasce em Évora c. de 1470 e morre nessa cidade em 1536, tendo a sua vida percorrido 3 reinados – D. João II, D. Manuel e D. João III – reis para os quais ele trabalhou. A sua função mais conhecida foi a de Secretário-tesoureiro da famosa embaixada de D. Manuel ao Papa Leão X.

É justamente considerado um dos grandes humanistas portugueses, que para além de escritor, foi músico de nomeada, trovador, engenheiro militar, etc, etc, à boa maneira do Renascimento.

Viveu os seus últimos anos de vida na sua cidade natal, tendo sido sepultado numa capela, por si mandada construir no Convento do Espinheiro.

Por tradição é esta casa atribuída a Garcia de Resende, o que poderá ser verdade, pois sabemos que ele tinha várias propriedades em Évora. O elemento mais importante da casa é a excelente janela, de cariz marcadamente manuelino. É uma janela de sacada, mainelada, correndo na parte superior do saimel dos arcos, uma moldura típica da decoração manuelina, com cordas em laçarias como que a segurar toros de madeira em armação de festa, remetendo-nos para a tradição da decoração efémera das romarias e festas populares.

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