terça-feira, junho 16, 2009

Vitrais

Desde muito cedo que os construtores perceberam a importância da luz na Arquitectura. Aliás, de tal forma se relevou esse facto, que hoje em dia a luz é considerada uma das matérias-primas mais importantes desta arte, senão a mais importante. E a luz é cor, é movimento, é ambiente.

Bem o entenderam os mestres construtores das catedrais góticas, que para além das enormes entradas de luz, grandes vãos vazados ou rosáceas finamente rendilhadas, utilizaram ainda os vitrais – verdadeiras pinturas de pedaços de vidraça colorida, bastas vezes historiados ou simplesmente de expressivo valor decorativo. A qualidade e a funcionalidade dessas obras, remete o vitral para um lugar cimeiro do reconhecimento público ao nível da História da Arte. Obra de operários anónimos, torna-se num elemento facilmente percepcionável pelos usuários da arquitectura, modelando e dinamizando formas e cores.

Curiosamente, a partir do século XVII, o vitral perde terreno na História da Arte Ocidental, provavelmente por questões ligadas à Reforma da Igreja. Contudo, os eclectismos oitocentistas recuperam, em parte, este saber-fazer, mas a sua especificidade técnica torna-o agora demasiado dispendioso para uma utilização usual.

Entretanto chega a vez daquele a que podemos chamar vitral moderno, mais propriamente pintura em vidro. A utilização de tintas gordas, transparentes e/ou opacas, juntamente com o contorno através do cerne, permitem uma expressividade idêntica ao do antigo vitral de vidraças cortadas. Embora tecnicamente diferentes, o valor da luz coada é semelhante, permitindo ambiências de qualidade e mais interessantes sob o ponto de vista económico. Mas esta é uma técnica que tem vindo a perder em termos estéticos, aparecendo quase sempre sob uma forma apenas decorativa e pouco criativa.

Nesta perspectiva, há que mudar, que inovar. E para inovar é preciso traquejo, contacto com a criação.

Esta exposição corre nesse sentido. Os formandos foram levados a percepcionar obras de outros autores, transpondo para a pintura em vidro outras técnicas, ou melhor, resultados de outras técnicas. As características expressivas deste tipo de vitral, acabam por conseguir uma re-criação, uma apropriação estética e funcional dessas obras, que, longe de constituir uma simples cópia, acabam por fazer emergir outros valores, importantes, eles mesmos, num processo de formação.

Releva-se ainda o tema escolhido – o corpo humano. É um tema, pela sua plasticidade intrínseca, que casa bem com esta técnica. As sinuosidades tácteis, impressivas do corpo, permitem o plasmar voluptuoso de formas no espaço plano, formas que vão ser valorizadas pela iridescência da passagem da luz pelas tintas. Então, os corpos migram, a ideia é corpórea, o resultado é luminoso.


João Castela Cravo


Venteira, 9 de Abril de 2007

in catálogo "Nus", Exposição de Vitrais, colectiva dos alunos dos cursos realizados no Centro Cultural Roque Gameiro, Casa Roque Gameiro, 5 de maio a 9 de Junho de 2007

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